O que se passa há muitos anos no Ministério da Saúde não tem nada que ver com "gestão de recursos humanos". O que se lá passa há muitos anos, tem que ver com uma lógica de completa incúria sucessiva do que é o interesse público, leia-se, interesse do contribuinte, que é quem suporta e supostamente usufrui do SNS.
Faltam médicos em Mogadouro, mas existem médicos a mais no Hospital Egas Moniz (em Lisboa). Não se podem mudar os médicos, ainda que não tenham nada para fazer. Depois, um médico que tenha uma especialidade, mas que não tenha doentes para ver dessa especialidade, não pode ser um médico de clínica geral, ou de família (que há supostamente falta). Porquê? Porque o lobby médico é forte, e o Estado e a legislação os favorecem! Mas, serão os médicos os culpados de toda esta situação? Evidentemente que não. Os culpados são os eleitos pelo povo, que não acautelam o interesse de todos, mas antes os interesses de uns quantos.
Depois, há imensos médicos, formados em escolas públicas, com a sua formação suportada pelo contribuinte, mas que fazem tudo menos exercer medicina. Estão em cargos políticos. São assessores de instituições nacionais e internacionais. Colaboram com a Indústria farmacêutica. Têm direito de o fazer? Têm. Mas, já não têm o direito de ficar com o seu "lugarzinho" salvaguardado! Pois, é que há milhares de médicos com licença sem vencimento mas com o lugarzinho "salvaguardado". Pois!
Depois, o poder eleito pelo povo, anda sempre atrás do leite derramado. Alguns exemplos:
1. Corrida às reformas antecipadas dos médicos fez soar o alerta vermelho. Governo estuda solução para evitar colapso de serviços. Assinar contratos individuais de trabalho com os médicos reformados, através de um regime de excepção na função pública. Esta pode ser a solução do governo para um problema criado pelo próprio governo quando mudou as regras da aposentação e levou a uma corrida às reformas entre os clínicos, para evitar penalizações.
2. Um médico em início de carreira (assistente) passaria a receber 2643 euros, de acordo com a tabela agora proposta. Mas os que estão a contrato individual de trabalho já recebem hoje em média 3 mil euros num hospital EPE (Entidade Pública Empresarial). Como os hospitais-empresa funcionam desde 2002 sem Acordo Colectivo de Trabalho, a regra da lei da procura e da oferta, num sector com falta de profissionais, prevalece - muitas vezes os EPE oferecem mais do que está previsto na tabela salarial da função pública para conseguirem ir buscar médicos para os seus serviços. Os sindicatos entendem que estes clínicos não podem ficar prejudicados. Até porque, com a transição progressiva dos hospitais para o universo EPE, representam já 90% do mercado de trabalho dentro do SNS.
3. A médica de família da Extensão de Saúde de Santo Estêvão, Benavente, está de baixa prolongada, o que deixa sem atendimento cerca de 1200 utentes da freguesia e de Foros de Almada. Os doentes têm de se deslocar ao Centro de Saúde de Benavente, onde também faltam médicos frequentemente. A população está revoltada e quer soluções urgentes para o problema. Os autarcas ameaçam sair à rua em protesto.